Parceiros que não conseguem confiar plenamente no cônjuge, mesmo que nunca tenham sido traídos por ele. A dor não vem do presente, mas do passado que ainda machuca. Amar exige entrega. Mas, para quem já foi ferido, essa entrega pode parecer um abismo. Algumas pessoas entram em um relacionamento com o desejo sincero de amar e serem amadas, mas são dominadas por um medo constante de abandono e rejeição — e, com isso, vivem presas em uma espécie de vigília emocional.
No livro Arquétipos no Amor, a autora Victória Buske apresenta o arquétipo do Órfão, uma representação emocional daqueles que carregam dentro de si um histórico de perdas, inseguranças e feridas afetivas profundas. Esse arquétipo ajuda a entender por que, em muitos casos, o amor vira campo de batalha — não por causa do outro, mas por causa dos fantasmas que ainda vivem dentro de nós.
O Ciclo da Autossabotagem
Pessoas dominadas pelo medo da rejeição podem acabar se sabotando. Elas hesitam em se abrir emocionalmente, temendo que, ao revelar suas vulnerabilidades, possam ser desprezadas ou abandonadas. Então, criam uma barreira invisível. Um muro de proteção que, infelizmente, também impede a construção de uma intimidade real.
Essa necessidade de proteção muitas vezes é confundida pelo cônjuge como apatia ou frieza. O parceiro começa a se sentir confuso: “Por que ele(a) parece distante, mesmo dizendo que me ama?”. E assim nasce um ciclo de insegurança e dúvida, onde a tentativa de se proteger gera afastamento — e o afastamento, mais medo.
A Dor de Não Conseguir Falar
Quem se sente assim normalmente não expressa suas necessidades de forma clara. Ao invés de dizer: “Estou com medo de que você se afaste de mim”, acaba demonstrando isso com ciúmes, distanciamento, ou desconfiança. A comunicação implícita vira regra — e o outro precisa adivinhar o que está acontecendo.
Com o tempo, isso gera frustração. O parceiro sente que não é ouvido, que falta conexão. As tentativas de conversar acabam em silêncio, acusações ou discussões vazias. O medo do abandono se transforma em desamparo emocional, e a resposta comum é agir com defesa: evitar discussões profundas ou se fechar ainda mais.
A Busca por Validação Constante
Quando o medo se torna insuportável, pode surgir a dependência emocional. A pessoa busca no outro uma validação constante: precisa ouvir o tempo todo que é amada, valorizada, escolhida. Mas esse desejo vira cobrança, e o parceiro se vê na obrigação de “provar” seu amor repetidamente.
Esse comportamento, com o tempo, sufoca. O amor perde o ar. A relação vira um esforço contínuo de manter o outro seguro — não emocionalmente estável, mas apenas não desesperado.
O Perigo da Manipulação Emocional
Em sua forma mais extrema, o medo do abandono pode se transformar em manipulação emocional. Frases como “Você vai me deixar como todos os outros?” ou “Se você realmente me amasse, não faria isso comigo” se tornam armas emocionais, provocando culpa e tornando o outro responsável pelo bem-estar afetivo do parceiro ferido.
A relação se desequilibra. Um ama tentando sustentar o outro, e o outro se prende às próprias inseguranças como se fossem a única forma de receber atenção e afeto.
A Cura Existe: E Ela Começa no Espelho
Como aponta Victória Buske em Arquétipos no Amor, entender que o arquétipo do Órfão está influenciando seu comportamento é um passo fundamental. Não se trata de culpa, mas de consciência. Amar com medo é humano — mas permanecer escravizado a esse medo, quando há possibilidade de cura, é uma escolha.
É preciso buscar autoconhecimento, amadurecimento emocional e espiritual. Terapia, leitura, oração, e principalmente, disposição para olhar para dentro e fazer as pazes com a própria história.
Um Relacionamento Não É Lugar de Prova. É Lugar de Reparo.
Ninguém precisa viver como se o amor fosse uma constante prova de fidelidade. Quando confiamos no outro, e sobretudo em nós mesmos, o amor pode respirar. A desconfiança não precisa ser companheira eterna. Ela pode ser substituída por cuidado, por diálogo, por verdade.
E se você reconhece em si ou no seu parceiro esse padrão de dor e autossabotagem, a leitura de Arquétipos no Amor pode ser um caminho valioso para compreender essas raízes emocionais e encontrar novas formas de amar — mais curadas, mais livres e mais leves.